[GCI-ICG] Invariável posição dos revolucionários perante a guerra – O significado do derrotismo revolucionario

| Čeština | English | Français | Deutsch | Español | Magyar | Português | Türkçe | Ελληνικά|

Grupo Comunista Internacionalista (GCI)

A posição dos revolucionários perante a guerra capitalista é sempre a mesma: opor a revolução social à guerra, lutar contra a “sua própria” burguesia e o “seu próprio” Estado nacional. Historicamente, essa posição chama-se o derrotismo revolucionário porque proclama abertamente que o proletariado deve lutar contra o inimigo que tem em seu próprio país, que deve actuar a fins de provocar a derrota dele e que só assim participa à unificação revolucionária do proletariado mundial, só assim se desenvolve a revolução proletária no mundo.

Desde as origens do movimento obreiro, a questão da guerra e da revolução, a questão da oposição entre a guerra e a revolução é uma questão central. É em período de guerra e de revolução (e a historia mostra-nos a interacção desses dois pólos) que se vê mais claramente quem está de lado e doutro da barricada; a posição perante a guerra e a revolução foi, ao longo da história, o ponto determinante sobre o qual um conjunto de forças e de partidos que se pretendiam revolucionários (ou socialistas, ou anarquistas, ou comunistas…) foram desmascarados e acabaram por revelar o seu carácter contra-revolucionário deles (1), afirmando que tal guerra era justa, que tal país foi agredido, que se opunham à guerra… somente em certas circunstancias, que apoiavam a libertação de tal nação contra tal outra…

Por oposto, do ponto de vista revolucionário, não há quaisquer dúvidas, não se precisa esperar pela declaração da guerra para conhecer a sua natureza, não são necessárias especulações geopolíticas em voga entre os intelectuais burgueses ou os periódicos cultos (como o Le Monde Diplomatique), pouco importa as declarações em nome da paz que se farão ambos concorrentes para saber quem é o “agressor” e o “agredido”: Como todas as posições programáticas do comunismo, a posição dos revolucionários perante a guerra entre Estados burgueses (ou fracções nacionalistas que pretendem à autonomia ou à independência) é simples e determinante:

  • não há guerra justas que se deva apoiar,
  • não há guerras defensivas,
  • todas as guerras de libertação nacional são inter-imperialistas (e portanto imperialistas),
  • não há um lado que defenda a paz e outra a guerra,
  • não há um lado que represente a barbaridade e outro a civilização,
  • não há um lado mais agressor que outro,
  • não há um lado democrático contra um lado ditatorial ou fascista.

Pelo contrário, todas essas formulas são utilizadas indistintamente por um ou outro beligerante para recrutar para a guerra deles (2).

A posição clássica dos revolucionários é opor-se com todas as forças a todas as guerras entre estados nacionais. Essa posição não provém de uma questão de ideias sobre o mundo tal que quereríamos que fosse – essa “ideia” que constitui o comum denominador de todos os pacifistas que, sempre em nome da paz eterna, acabam invariavelmente defendendo este ou outro lado da guerra, ratificando em realidade a vocação deles de defensores da “paz dos túmulos”. A posição revolucionaria provém pelo contrário dos interesses materiais do proletariado, do facto que o seu antagonismo geral com o capital não é uma oposição a uma qualquer fracção burguesa segundo a política governamental decorrente, senão uma oposição à totalidade da burguesia, independentemente da política em vigor. O nosso antagonismo prático a todas as guerras nacionais é a consequência inevitável de que não nos opomos aos burgueses por serem “fascistas” ou “democratas”, de esquerda ou de direita, nacionais imperialistas ou imperialistas nacionalistas, mas pura e simplesmente por serem burgueses. A nossa oposição é a consequência de uma verdade inevitável: entre exploradores e explorados não pode haver qualquer unidade que não seja vantajosa ao primeiros, qualquer “frente comum” ou “apoio crítico” de um lado contra outro sempre beneficia à burguesia na sua luta contra o proletariado.

Cada classe actua em função dos seus interesses e do seu programa fundamental. O capital não passa de um conjunto de capitais que se enfrentam. Dentro do próprio capital está contida a guerra entre capitais, e por isso precisamente, as fracções burguesas todas, quais que sejam os discursos delas, participam de um modo ou outro ás guerras comerciais e militares que derivam da própria natureza do valor, que luta contra os outros valores para valorizar-se.

Da mesma maneira, só o proletariado pode actuar como classe, recusando-se a servir de carne para canhão nas guerras nacionais. Não se trata de uma opção entre várias outras, senão da sua própria existência como classe: não existe qualquer interesse particular ou regional que o oponha a outros proletários. Por oposto, cada fracção do proletariado, por limitada que seja a sua acção de classe contra o proletariado, contem a globalidade, exprime os interesses da humanidade inteira opondo-se a guerra.

Nos será replicado que nas numerosas guerras nacionais que têm ocorrido, proletários efectivamente apoiaram um ou outro lado. E verdade, mas não o fazem em acordo com os seus próprios interesses, fazem-no precisamente na base da dominação ideológica da classe dominante. Não o fazem como classe mundial mas como carne para canhão. Não o fazem como classe revolucionaria mas negando-se como classe, e aderindo ao povo, à nação, que é a negação do proletariado (que não tem pátria). A guerra burguesa, com participação popular maciça (como a dita segunda guerra mundial) é a liquidação do proletariado, do próprio sujeito da revolução ao benefício do capital. Portanto para além dos interesses subjectivos que atraem cada capitalista, cada fracção burguesa dentro da guerra comercial e a seguir militar, o capital no seu conjunto tem um interesse objectivo na guerra: a destruição do sujeito da revolução, a eliminação, por vezes para um longo período histórico, do comunismo como força.

Perante isso, o desenvolvimento do proletariado como classe surge da própria vida. De facto, a nossa luta começa com a nossa própria existência como classe, pelo conflito, desde a nossa nascença, com a propriedade privada, com o capital, com o Estado. Por isso, as nossas posições, como proletários revolucionários organizados, não derivam das considerações emitidas pelos beligerantes, senão do nosso combate permanente contra a exploração, as condições de vida desumanas que este sistema nos impõe e que atingem o grau supremo em tempo de guerra.

Mas como o capital é a essência desta sociedade, como o capital não pode viver sem guerras periódicas e que o seu ciclo de vida baseia-se sobre as destruições sucessivas de forças produtivas, a única oposição real, radical, profunda contra as guerras é a oposição revolucionária; só a revolução social acabará uma vez por todas com elas.

Por isso o grito dos revolucionários contra a guerra sempre foi: “transformemos a guerra imperialista em guerra social para a revolução comunista”.

Isolado, este slogan todavia revelou-se historicamente insuficiente porque a oposição real à guerra e ao capital internacional significa na prática uma oposição aberta à burguesia e ao Estado, que, de cada lado, recruta para a guerra. E essa oposição exprime-se muito praticamente porque a burguesia sabe utilizar o arsenal ideológico todo do Estado para impor o recrutamento e a adesão à guerra: “estado de guerra”, censura generalizada, mobilização geral, fanatismo nacionalista (racismo, xenofobia, sectarismo religioso), repressões dos revolucionários acusados de conivência com o inimigo (espionagem, traição da nação,…) (3).

Em tais circunstâncias, declarar-se contra a guerra e a burguesia em geral, sem ter uma acção concreta contra a exploração que a guerra gera, não passa de uma simples formula de propaganda em vez de ser uma directiva revolucionária para a acção. De facto, a guerra burguesa concretiza-se antes de tudo pela guerra de um Estado contra o “seu” proletariado, isto é contra o proletariado do seu país, para esmagá-lo, liquidar as minorias revolucionárias e arrastá-lo progressivamente para dentro da guerra burguesa. É por isso indispensável e inelutável assumir o facto que “o inimigo está dentro do país”, que se trata da “nossa própria burguesia”, do “nosso próprio Estado”. É na luta para provocar a derrota da “sua própria burguesia” que o proletariado assume plenamente a solidariedade internacional com a revolução mundial. Ou, para considerá-lo de um ponto mais global, a revolução mundial constitui precisamente a generalização do derrotismo revolucionário do proletariado mundial.

No entanto, o proletariado “de” tal ou qual (4) país não pode atingir a “sua” burguesia, nem estender a mão ao proletariado “do outro lado”, em guerra ele também contra o “seu” Estado, sem cometer um delito de alta traição, sem contribuir à derrota do “seu próprio exército”, sem actuar abertamente à degradação da defesa nacional. O derrotismo revolucionário concretiza-se não só pela fraternização com os soldados (proletários em uniforme) do lado “oposto” (única forma aceite pelo centrismo), mas também pela acção concreta de destruição do “seu próprio exército”.

Historicamente, os revolucionários distinguem-se igualmente dos centristas pelo apelo à organização independente dos soldados contra os oficiais, pela direcção que dão à acção concreta de sabotagem do exército, pelo apelo ao afastar as armas do “inimigo exterior” e voltá-las contra os oficiais da “sua própria pátria” (e pela luta energética para que isto seja posto em prática).

De facto, a experiência da guerra a da revolução, e, em particular, a experiência concreta do que foi chamado a “primeira guerra mundial” permitiu clarificar que o apelo à luta revolucionária contra a guerra burguesa é totalmente insuficiente e praticamente centrista se não é acompanhado da sua concretização prática, isto é a luta aberta contra a “sua própria” burguesia, para a derrota do “seu próprio” Estado. Em todos os casos, portanto, a guerra contra o estrangeiro significa antes de tudo a guerra contra o proletariado desse país. De facto, quando se está praticamente confrontado a uma mobilização geral dirigida por uma burguesia ou um Estado nacional concreto, dizer que se luta contra “todas as burguesias, quaisquer que sejam”, ou chamar à “luta revolucionária contra a guerra” sem actuar de maneira concreta para a derrota do “seu próprio” país equivale a cair no propagandismo (5) e favorecer o patriotismo.

Durante a dita primeira guerra, o centro da Segunda Internacional (por oposto à direita que se declarou para a “defesa da pátria”) afirma opor a revolução à guerra e lança apelos tão radicais como “guerra à guerra”. Mas, ao mesmo tempo, opõe-se ás directivas derrotistas revolucionárias porque pretende (como os generais do exército!) que beneficiariam ao inimigo nacional e acabam por propor slogans do tipo “nem derrota nem vitória”.

É preciso não esquecer que nunca uma fracção burguesa se declarou em favor da guerra, afirmam todas lutar para a paz, e até os generais bem sabem que a paz não passa de uma arma fundamental da guerra. Quando os sociais-democratas, como E. David, votam os créditos de guerra (6), não é em nome da guerra, senão em nome da paz e para “evitar a derrota”. Eis como E. David justifica o seu voto: “O sentido do nosso voto do 4 de agosto é o seguinte: não para a guerra mas contra a derrota”. É claro que perante a guerra que se concretiza em guerra entre o proletariado e o “seu próprio” Estado, esta clássica posição do socialismo burguês tanto como a outra que preconiza “nem derrota nem vitória” desorganizam o proletariado e contribuem a levá-lo à chacina.

[…]

Notemos que o derrotismo revolucionário (opor a revolução social à guerra), essa concretização da posição de sempre dos revolucionários, não surge de uma especulação ideológica sobre a política de esta ou aquela fracção burguesa, senão da própria essência do proletariado, das sua necessidades vitais. De facto, a luta contra o proletariado, a totalidade do conteúdo programático da revolução comunista surge da luta contra a exploração. O mais natural, é que o proletariado confrontado à guerra não só não abandone a luta permanente contra a exploração (luta contra os “seus” patrões, “seus” burgueses, “seus” sindicatos, “seu” governo) mas que a intensifique, porque a guerra implica sempre que as condições de exploração, e, em geral, o conjunto das condições de vida, sejam brutalmente agravadas. Serão esses mesmos patrões, esses mesmos sindicalistas, esses mesmos políticos e governantes, que, sem excepção, farão de tal maneira que o proletariado faça abstracção das suas condições de vida e pedirão mais sacrifícios, mais trabalho menos remunerado, e muitas outras coisas, que segundo o país ou as circunstancias, irão da colecta voluntária para o exército ao decreto ministerial que impõe dias de trabalho forçado para apoiar o esforço de guerra ou a punção de uma certa percentagem do salário para contribuir ao esforço de guerra da “nação” […]. Nessas circunstancias, enquanto o nacionalismo ataca o proletariado, o centrismo tenta enfraquecer a luta revolucionária imediata (8) contra os sectores da burguesia que impõem directamente os sacrifícios da guerra. Para isso, não hesita a lançar vagos apelos relativos à oposição da revolução à guerra em geral, arguindo que não se pode entrar no jogo do “país inimigo”, que a luta contra o capitalismo em geral não requer o derrotismo revolucionário absoluto, porque todas as fracções do capital são iguais(9). Ora é precisamente nesses momentos quando qualquer luta imediata contra a exploração reveste o carácter de sabotagem do esforço nacional e quando a luta revolucionária torna-se indispensável para obter o pão quotidiano que essas posições próprias ao centrismo (posições que são parecidas a uma posição clássica do neutralismo burguês acrescentada de um conjunto de declarações retumbantes contra a guerra e em favor da revolução) podem servir de última barreira de retenção contra-revolucionária.

Em todas as guerras, o nível de exploração do proletário aumenta de maneira directa e as suas condições de vida degradam-se por causa das destruições, da falta de aprovisionamento e porque todas as guerras significam o desencadeamento do terrorismo de Estado para convencer os proletários de matar e morrer nas batalhas.

É por isso que a luta contra a “sua própria” burguesia, combater para a derrota da “sua própria” nação (imperialista) não são posições inventadas ou introduzidas no movimento pelos revolucionários. É o resultado do próprio desenvolvimento da luta contra a exploração, que, com a guerra, faz um salto qualitativo. A separação entre economia e política dentro da qual se pretende embair os proletários e que parece ter uma certa realidade em tempos de paz é praticamente liquidada durante a guerra: a ilusão de defender as condições económicas do proletariado sem fazer política arruina-se. Qualquer acção do proletariado para defender os seus interesses vitais opõe-se a política do “seu próprio” Estado: em tempos de guerra, a luta “económica” do proletariado é directamente uma luta derrotista, é directamente uma luta revolucionária. O derrotismo revolucionário é uma questão de vida ou de morte para o proletariado. Qualquer acção baseada sobre os interesses proletários conduz à derrota do “seu próprio” Estado e […] qualquer agitação realmente revolucionária é uma contribuição à derrota do “seu próprio” Estado.

Por isso mesmo, quando se pretende que é necessário abandonar a luta contra a exploração, ou que não é o bom momento ou que o inimigo principal é outro (“ditadura” ou “fascismo” (10),…), cada vez trata-se efectivamente de liquidar pura e simplesmente a luta do proletariado. Pior ainda, como em período de guerra não se pode defender as suas condições de vida mais elementares sem lutar contra os “seus próprios” burgueses, sem actuar abertamente para a derrota do seu “próprio” governo, não fazê-lo é renunciar não só aos seus interesses materiais mais elementares, mas também à sua existência como classe.

Aparece claramente que a posição dos perante a guerra encontra-se em completa harmonia com essas posições gerais visto que estas surgem dos interesses dos próprios proletários, dos seus interesses imediatos e históricos, que são inseparáveis. Sob nenhum aspecto ou circunstancia tem o proletariado qualquer interesse em sacrificar quer que seja em nome da guerra contra o inimigo exterior, nunca tem interesse em aceitar, sob o falacioso pretexto dos inimigos serem todos iguais, o slogan “nem derrota nem vitória”. Cada vez que se lhe pede de deixar de lado as suas condições de vida, que se exige sacrifícios em nome da luta contra o fascismo, o imperialismo, o inimigo exterior… atraiçoa-se os interesses dele.

Para concluir, temos de responder a uma objecção que desde sempre se enfrenta à posição derrotista revolucionária. É evidente que a contra-revolução assimilará a derrota nacional à vitória nacional do adversário. Aliás, é na base de esse argumento que os centristas lançaram slogans tais que “nem derrota nem vitória”. É evidente que essa posição situa-se exclusivamente no contexto nacional (e não de classe) e que se trata de uma conceição que vê na guerra as vitórias ou as derrotas nacionais, e não a liquidação revolucionária do exército, a insurreição proletária, etc… E mesmo se essa posição pretende ser de esquerda ou extrema esquerda, resta que constitui o argumento militarista e imperialista por excelência, o argumento dos generais que conduzem a guerra. Para estes, é lógico que o proletariado revolucionário seja “traidor da nação”, que favoreça “o inimigo da pátria”. A realidade é que mais se acelera a derrota do exército nacional, e mais se produzem levantamentos das tropas e amotinações insurreccionais, mais a fraternização se estende na linha dos combates, e mais o exército nacional adverso se enfraquece, e verifica-se na história que são os oficiais do “osso próprio exército” que acabam por entender-se com os oficiais “adversos” para lutar juntos contra o movimento proletário. E esse entendimentos entre oficiais inimigos são perfeitamente normais visto que a descomposição insurreccional do Estado sempre ultrapassa o contexto estritamente nacional, porque quando o proletariado está realmente a atacar a “ua própria burguesia”, “seu próprio exército”, “seu próprio Estado”, está a atacar a burguesia inteira, todos os exércitos burgueses, o Estado mundial, em resumo o capital mundial na sua totalidade. Perante esse processo de derrotismo generalizado, vemos ao longo da história capitalista a burguesia mundial procurar a unificação, obter acordos contra a deserção em ambos lados beligerantes, atacar em conjunto os bastiões insurreccionais. É então inevitável que o confronto classe contra classe passe em primeiro plano.

Para voltar ao que argumentávamos, o derrotismo revolucionário é a melhor maneira de transformar a guerra imperialista em guerra civil revolucionária, a guerra entre nações ou fracções do capital em revolução social.

Além disso, mais se afirmam a derrota e a desorganização do “nosso próprio Estado”, menos este é capaz de reprimir a acção revolucionária e mais fácil é comunicar e centralizar a acção revolucionária desenvolvida pelo proletariado do “outro lado”. A luta contra a “sua própria burguesia” e contra o “seu próprio Estado” atinge um nível supremo quando, dos dois lados da linha dos combates, a agitação e a acção directa conduzem à desorganização e à derrota revolucionária de todos os exércitos, fortificando perante estes a acção revolucionária do proletariado.

É obvio que, muitas vezes, o derrotismo revolucionário é mais forte de um lado que do outro. Isto resulta em geral do facto que o enfraquecimento político-militar é mais importante num dos lados e/ou do facto da própria acção revolucionária, da organização dos soldados, do carácter mais decidido dos sectores da vanguarda do proletariado. Do ponto de vista burguês, tudo isto será utilizado para afirmar que se favorece o adversário nacional. Mas a força do derrotismo revolucionário de um lado permite desenvolver e reforçar de maneira mais decidida ainda o derrotismo revolucionário no lado oposto. Os mecanismos que deram resultados de um lado também serão aplicados. Assim, a acção coordenada com os internacionalistas que se encontram do outro permitirá uma propaganda derrotista bem mais eficaz e os apelos deserção no outro terão mais força e serão entendidos melhor pelos soldados.

Não se deve esquecer que a transformação da guerra imperialista em guerra social revolucionária só é possível graças à generalização do derrotismo revolucionário, que, por seu lado, requer uma agitação e uma acção directa operada de lado e doutro. Essa agitação e essa acção directa serão aproveitadas pelos sectores da vanguarda do proletariado que coordenarão a acção para além das linhas de demarcação que a burguesia internacional tenta impor. Será precisamente no lado onde o derrotismo revolucionário é o mais generalizado e o mais profundo que as minorias vanguardistas serão mais aptas a desenvolver o derrotismo revolucionário no lado “oposto”. Por consequência, onde o derrotismo é mais fraco, onde a repressão se exerce sem obstáculo, o suporte revolucionário mais forte provirá dos camaradas, que, do outro lado, conseguirão impor a derrota revolucionária. Como se disse, a ajuda mais preciosa dos camaradas “do outro lado” virá da derrota revolucionária do exército deles; à medida que esta se descomporá, esses camaradas verão aumentar a capacidade de chamar à fraternização no campo de batalha, à deserção, à organização da luta para a generalização do derrotismo em todos os exércitos burgueses.

O derrotismo revolucionário é por essência geral e nunca nacional. Apesar de se exprimir a níveis diferentes em países ou fracções burguesas diferentes, quando se concretiza de um lado tende inevitavelmente a generalizar-se aos outros. Esta determinação histórica é assumida e dirigida pela vanguarda do proletariado que tenta concentrar os seus esforços derrotistas (propaganda, acções, sabotagens…) precisamente onde nesses lados o derrotismo tem menos força para mostrar ao proletário que com o triunfo do derrotismo revolucionário não tem nada a perder, apenas um mundo novo a ganhar.

Em todas as grandes experiências revolucionárias pode-se constatar um fenómeno inevitável de generalização do derrotismo revolucionário (11). Ao contrário dos argumentos defensistas ou neutralistas (dos centristas), longe de ser mais facilmente invadido ou controlado, um país no qual o derrotismo revolucionário consegui impor-se constitui um risco enorme para a burguesia do lado oposto que deseja continuar com a guerra inter-burguesa. Desde a Comuna de Paris até a revolução proletária na Rússia em 1917, nota-se que perante o movimento insurreccional do proletariado, o exército nacional “oposto” encontra-se paralisado e confrontado com uma tendência à fraternização assim como acções contra a burguesia “dele”. Quando em 1918/19 a burguesia alemã decide desconsiderar isso e continuar a guerra imperialista contra a Rússia insurrecta, apercebe-se rapidamente que o derrotismo revolucionário adquire uma força insuspeita na Alemanha graças ao contágio e à acção derrotista revolucionária dos comunistas dos dois lados. Por resultado a insurreição propaga-se também na Alemanha. Os antigos aliados da Rússia declararam então também a guerra à Rússia revolucionária sob o pretexto de ela não ter “respeitado os acordos diplomáticos e militares anteriores” e uma dezena de exércitos tenta então liquidar o movimento insurreccional na Rússia. Mas aqui também o derrotismo revolucionário generaliza-se a todos os exércitos e a organização dos obreiros e soldados assim que a fraternização, a execução de oficiais, a ocupação de navios pelos marinheiros revoltados e dos quartéis pela tropa estende-se tanto ás forças francesas como inglesas, americanas,… O derrotismo revolucionário é geral em todos os países que participaram à guerra, tal como durante a vaga mundial de insurreições proletárias de 1919. Os burgueses mais lúcidos percebem então que não é possível combater uma insurreição e o derrotismo revolucionário simplesmente mandando mais soldados, mais exércitos, porque estes se descomporão sempre mais rapidamente perante ao proletariado insurrecto. Winston Churchill exprimirá essa verdade dizendo que tentar esmagar uma insurreição com um exército equivale a tentar conter uma inundação com uma vassoura.

O derrotismo revolucionário não pode ser concebido como uma questão de países ou de nações, senão como uma oposição geral do proletariado ao capital. Até agora, falámos, sem outros esclarecimentos, da “nossa própria burguesia”, do “nosso próprio Estado”, etc… Mas, como sabem todos os nossos leitores, o nosso grupo nunca deixou de afirmar, desde a sua origem, que o Estado é mundial e que o capital é mundial. Do ponto de vista derrotista revolucionário, quando se age contra a “sua própria burguesia” ou o seu “próprio Estado”, isto não tem nada a ver com a nacionalidade dos burgueses ou do governo que se enfrenta, como os nossos inimigos pretendem, deformando o conteúdo invariável das nossas posições. Nunca repetiremos suficientemente que o proletariado deve lutar contra todos os burgueses, todos os governos. Trata-se somente de afirmar a luta contra os patrões directos e os corpos de repressão directos, mas como parte da luta mundial do proletariado contra o Estado mundial. A luta do proletariado não se pode assentar sobre nenhum intermediário, e é exactamente por isso que a luta contra o capital é sempre luta contra a exploração e a repressão estatal directa. A luta contra a exploração e a repressão directa ataca as bases da acumulação do capital e do Estado mundial. Isto é: a característica central da luta do proletariado é a centralidade orgânica da sua acção directa contra o capital, pela qual (ao contrário da luta do capital) mesmo se essa luta se desencadeia num só bairro, num só distrito industrial, numa só cidade, ela contém a totalidade e representa, independentemente da consciência que têm disso os protagonistas, os interesses orgânicos gerais do proletariado considerado como globalidade.

Para a burguesia e para o proletariado, as determinações centrais da luta são exactamente opostas. Mesmo quando ela pretende ter uma validade geral, a luta de uma fracção burguesa (12) contém sempre um interesse egoísta e particular porque todo movimento de valorização ataca sempre outros movimentos de valorização com interesses forçosamente contraditórios. É por isso que a noção de unidade defendida por uma fracção burguesa é fundamentalmente uma unidade democrática, uma aliança instável, resultado da unificação de interesses opostos, e que se racha em permanência. Quais que sejam os níveis de unificação burguesa trata-se sempre de uma união temporária, contra outras fracções rivais. Pelo contrário, o proletariado, mesmo quando luta sobre um aspecto particular, afirma o seu ser orgânico como totalidade perante o capital no seu conjunto.

É por isso que quando falamos do “nosso próprio” Estado, da “nossa própria” burguesia, não queremos falar da burguesia e do Estado dessa nação (13), mas simplesmente da burguesia que nos explora directamente, esses que nos reprimem quotidianamente, os padres e/ou sindicalistas que devemos enfrentar cada dia e que tentem levar-nos ao matadouro, resumindo, o tentáculo do Estado que nos encerra e que devemos cortar para melhorar a nossa relação de forças contra o monstro capitalista mundial.

Se a qualquer momento, para restabelecer a ordem do capital, outros patrões são postos na posição destes que enfrentamos cada dia, ou se o governo solicita uma ajuda exterior para reprimir-nos, o derrotismo revolucionário continuará a aplicar-se contra esses novos patrões e essas novas forças repressivas independentemente das nacionalidades deles, da mesma maneira e para as mesmas razões que foram combatidos os precedentes patrões e governo. Esta posição é fundamental no contexto da polémica burguesa e imperialista que trata da libertação nacional. De facto, várias vezes tentou-se desviar a luta contra os burgueses locais para a luta contra os burgueses “imperialistas estrangeiros” (14) e várias vezes tentou-se impor a luta entre fracções nacionais contra a luta de classes. A situação mais complexa surge quando a burguesia local, totalmente ultrapassada pelo “seu próprio” proletariado e tendo em oposição sectores burgueses com discursos “anti-imperialistas” solicita a ajuda da fracção imperialista estrangeira para reprimir o proletariado insurrecto; ou quando a fracção que se diz “anti-imperialista” opõe-se militarmente ás outras. Nesse caso, tenta-se entalar o proletariado entre duas opções imperialistas, procurando assim transformar a sua luta social em guerra imperialista. Mas mesmo nessa situação, não se trata de um novo fenómeno. Trata-se de uma clássica guerra imperialista contra o proletariado, recoberta, como todas as guerras imperialistas, de bandeiras nacionais (15). É claro que perante isto a posição dos revolucionários não muda em nada, pelo contrário! O derrotismo revolucionário demonstra toda a sua pertinência e continua a aplicar-se integralmente tanto contra os “libertadores da nação” que se pretendem “anti-imperialistas” que contra a força militar da “potência imperialista” que procura restabelecer a ordem.

Em todas as situações portanto, a luta revolucionária para a transformação da guerra imperialista em guerra social contra a “sua própria” burguesia concretiza-se pelo derrotismo revolucionário, isto é pela luta contra o inimigo que se encontra no “próprio” país, contra o inimigo que assume directamente, em nome do capital mundial, a “nossa” exploração directa. A força do proletariado perante o capital depende precisamente da sua capacidade a adaptar-se à luta contra as diferentes fracções burguesas, contra as diferentes formas de dominação que o capital procura impor-nos.

Perante qualquer guerra burguesa, os revolucionários fizeram, fazem e farão sempre o mesmo apelo ao derrotismo revolucionário.

Hoje como ontem:

O inimigo está dentro do “nosso país”, é a “nossa própria” burguesia!

As armas que eles querem que apontemos para o estrangeiro, apontemo-las contra o “nosso próprio” Estado!

Transformemos a guerra inter-burguesa em guerra revolucionária!

Transformemos a guerra entre Estados em guerra para destruir todos os Estados!

Notas

1. O fato de que a social-democracia européia oficial, se coloque em 1914 do lado da guerra nacional, não é mais do que a confirmação de sua natureza contra-revolucionaria que muitos militantes revolucionários tinham sempre denunciado. A social-democracia alemã em particular, por outra parte, já tinha apoiado a ação militar imperialista de “seu próprio” Estado. Mas o fato de que em 1914 o caráter imperialista e burguês dos partidos socialistas ficasse totalmente desmascarado conduz muitas vezes à mistificação (mantida por um sem-número de grupos e partidos centristas) de que a social-democracia abandona somente em tal ano o caráter de organização proletária.

2. Aqui se trata unicamente de afirmar nossas posições sem argumentação, nem explicação. Para quem queira conhecer nossa explicação de, por exemplo, por que toda guerra de libertação nacional é uma guerra imperialista, ou por que a paz é parte da guerra, ou por que recusamos todo apoio de um bando democrático contra um ditatorial ou fascista, devem ser lidos outros números de nossa revista central Comunismo […].

3. Neste “etcétera” os Estados chegaram até a bombardear regiões inteiras em onde se agrupavam os desertores (vejam nossos diferentes textos sobre a luta de classes no Iraque), até a destruir cidades e povos inteiros pela falta de adesão à guerra.

4. Sempre é mais correto programaticamente entender o proletariado (mundial) em tal ou qual país, mas às vezes parece uma formulação demasiado pesada dada a linguagem dominante. É sumamente importante, no que se segue, não perder nunca de vista que, independentemente da formulação que nos vemos forçados a empregar, nós nos referimos sempre ao proletariado mundial em tal ou qual região ou país.

5. No fundo se trata da mesma posição idealista como a que sustentam aqueles que não se deve lutar pelas reivindicações imediatas porque isso é reformista e que se deve lutar pela revolução. Como se os reformistas pudessem satisfazer os interesses imediatos do proletariado! Como se a luta pela revolução social pudesse emergir e fortificar-se de outra maneira que não pela generalização de todas as reivindicações imediatas! Como se a própria revolução não fosse outra coisa que a necessidade cada vez mais imediata do proletariado em seu conjunto!

6. O famoso voto dos créditos de guerra pelos social-democratas com o qual tanta celeuma se fez, não é nada mais do que a parte simbólica de uma ação generalizada da social-democracia para quebrar ao proletariado e levá-lo ao matadouro. A mistificação consiste em se crer que este voto foi decisivo para a guerra quando não foi mais do que uma formalização parlamentar de uma ação muito mais generalizada que durou décadas de domesticação social-democrata para que os proletários aceitassem ir matar e a fazer-se matar em interesse dos senhores burgueses. Feito esteesclarecimento, devemos acrescentar que os próprios social-democratas sempre mistificarameste voto, por isso resulta interessante citá-los quando pretendem justificar o mesmo.

[…]

8. Nosso Grupo condenou sempre a separação social-democrata entre luta econômica e luta política, entre luta imediata e luta histórica que leva sempre a estabelecer depois programas intermediários ou pontes. Isto certamente tem uma validez geral, mas é precisamente, em épocas de guerra e de consecutivo esforço e mobilização nacional, que nossa afirmação resulta socialmente mais evidente e diretamente admissível. Efetivamente neste momento toda luta econômica do proletariado ataca o esforço nacional de guerra, toda luta imediata contra a exploração assume um caráter de guerra contra o Estado e que a luta autônoma do proletariado é imediatamente luta revolucionária.

9. É evidentemente verdadeiro que todas as frações do capital são igualmente inimigas do proletariado, o problema é que esse argumento serve nestas circunstâncias para paralisar a única luta que é possível: a luta concreta contra a burguesia e o Estado que explora, domina e impõe o esforço nacional de guerra. Mais ainda, é essa a única maneira que tem o proletariado de desenvolver sua própria potência e de lutar ao mesmo tempo contra a burguesia do campo adverso e contra todo o capital em geral, o que se concretiza, como veremos em seguida, com a derrota revolucionária do“seu exército” e a generalização da insurreição.

10. Assustar com o fantasma do fascismo é uma constante da contra-revolução que a humanidade pagou com centenas de milhões de mortos desde os anos 20 (entre eles os 60 milhões de mortos dachamada Segunda Guerra mundial). Recordemos que foi com o fantasma do fascismo que o Estado (republicano) consegue liquidar e desarmar ao proletariado na Espanha em 1936/37 que constituía a última barreira revolucionária à guerra que o capital mundial precisava impor e que em última instância, conseguiu levar adiante.

11. E vice-versa: quando o derrotismo revolucionário não se impõe em nenhuma parte e o proletariado foi submetido à nação, àfrente popular, ao fascismo e ao antifascismo, como por exemplo sucede-se durante o chamada “segunda” guerra mundial o nacional imperialismo se desenvolve em todas as frentes e em todos os campos e a generalização do massacre é total. Nesses casos a guerra destrói tudo o que o capital precisa para reiniciar um novo ciclo expansivo baseado nas montanhas de cadáveres de “operários”mortos abraçados à sua bandeirinha nacional.

12. E o Estado Ianque não é o primeiro na história da formação social burguesa a pretender encarnar os interesses gerais do capital mundial! Desde a origem do capitalismo diferentes potências e alianças burguesas (desde o próprio Vaticano às Companhias das Índias ou à potência marítima do Império Britânico) tentaram criar uma ordem única e firme. Mas essa unidade sempre se racha, lançando por terra todas as teorias sobre o Monopólio mundial e o Ultra-imperialismo que tantos aficcionados teve e tem no campo da burguesia em geral e da social-democracia em particular.

13. Ademais, como vimos em sucessivos textos, a nação não coincide nunca com a estruturação em Estados da burguesia.

14. Não se deve esquecer que os burgueses locais, são também imperialistas.

15. Aproveitamos para sublinhar que contrariamente a todos os mitos a respeito da “libertação nacional” este tipo de guerra do capital não é característica de “países coloniais”, “pobres” ou “subdesenvolvidos” como diz a “esquerda burguesa”,mas do mundo inteiro e continua sendo na velha Europa onde mais “guerras nacionais” teve e terá enquanto o capitalismo durar. Também não pertencem ao passado do capital ou a uma fase do mesmo, mas que são produto do próprio desenvolvimento do capital e seguirão existindo enquanto este sistema social existir.

Comments are closed.